sábado, 19 de abril de 2008

Globalização

Eis aí um tema interessante. Tão na moda, já virou mesmo um clichê; mas ainda assim, o contato com culturas diversas traz novas opiniões, diferentes pontos de vista e um grande aprendizado – até mesmo sobre nossa própria cultura.

Outro domingo tive a oportunidade de ir à praia com um bem humorado sujeito chamado Irwan (leia-se Irruán), um indonésio, engenheiro de telecomunicações, que veio parar em Fortaleza como funcionário da Nokia, uma empresa Finlandesa que presta serviços à Claro, brasileira filiada à mexicana Telmex. Confuso? Não, globalizado.

Primeiramente, ele me reclamou o fato de não ter encontrado por aqui nenhuma mesquita; como bom muçulmano, Irwan (que em nada lembra um árabe) gostaria de um local adequado para praticar suas orações. Infelizmente, não pude ajudá-lo; até onde sei, não há mesmo nenhuma mesquita em Fortaleza. É estranho como no Brasil, um país legalmente laico, sejam tão pouco significativas as religiões não cristãs, e tão esmagadora a presença da Igreja Católica.

Mas isso não foi grande problema. Irwan estava feliz numa praia do Brasil. E, como bom turista, queria provar e comprar de tudo. Chato mesmo foi para mim, que tive de bancar o intérprete. A falta de paciência me fez indagar: o Inglês não é lá uma língua difícil – nem muito cara – de se aprender; em Fortaleza, uma ‘cidade turística’, isso bem poderia ser incentivado, quem sabe bancado pela prefeitura. Mas pra quê? Dinheiro público é para gastar com festa; comunicação entre vendedor e turista deixa com a mímica e o enrolês mesmo; se dá certo assim, então tá bom...

Já cansado de comer camarões e caranguejos (esses deram muito trabalho), nosso ilustre estrangeiro resolveu conversar um pouco sobre os mais diversos assuntos. Por sua formação, acabou falando em eletrônica, e me perguntou por que aqui todos os equipamentos desse tipo são tão caros. Falei que muitos são importados e, mesmo sobre os fabricados aqui, são cobrados impostos elevados. Ele então me perguntou: “e vocês não reclamam?”. Um pouco desconfortável, respondi que sim; mas confessei que não era o bastante. Ele, com um grande sorriso, falou: “deve ser porque vocês têm carnaval e todas essas lindas praias... não podem mesmo reclamar de nada!” Não pude esconder minha frustração diante da triste verdade; mas, como eu já disse, globalização traz novas opiniões, diferentes pontos de vista e um grande aprendizado – até mesmo sobre nossa própria cultura.

O airbag

Assistindo a um bem humorado programa sobre automóveis numa TV internacional (Top Gear, da BBC), deparei-me com uma reportagem interessante, que me deu bastante orgulho: falava sobre o “menor Volkswagen que você pode comprar” (na Inglaterra, claro), nada menos que o VW Fox, desenvolvido e fabricado aqui, em nosso querido Brasil.

Durante a reportagem, para a minha frustração, percebi algumas diferenças: de série, o Fox vai para a Inglaterra com motor 1.2 a gasolina, trio elétrico, limpador e desembaçador traseiro, condicionador de ar, direção hidráulica e airbag. Para agravar, era tido como um carro simples, prático, voltado para o público mais jovem, acima de tudo, barato. Tudo bem, vamos encarar a realidade: o poder aquisitivo do público jovem daqui não é o mesmo de lá. Melhor nos recolhermos a nossa inferioridade, e deixar de lado esses opcionais bobos (que lá são de série), como trio elétrico, direção hidráulica... enfim, um 1.0 basicão anda (quase) do mesmo jeito.

Há um item, entretanto, que realmente me preocupa: o airbag. Comprovadamente, ele aumenta – e muito – as chances de sair ileso (ou pelo menos vivo) de uma colisão. Será que apenas pela nossa "escassez de riquezas" devemos morrer ao sofrer um acidente? Por que essas bolsas infláveis não são equipamentos obrigatórios – como são os cintos de segurança?

Uma resposta quase imediata seria criar uma lei que obrigasse os fabricantes a instalar tal equipamento em todos os veículos produzidos, a exemplo dos cintos de segurança; houve o tempo que o de três pontos não era obrigatório, assim como usá-lo ou não era opção de quem estivesse no carro. Mas não é assim tão simples. A situação econômica dos fabricantes (como a do país inteiro) não é lá das melhores; sua justificativa é plausível: a instalação desse caro equipamento iria encarecer a produção, e esse preço seria repassado ao consumidor – como é nos veículos que oferecem esse opcional. E justamente falando em opcionais, para os consumidores que não dispõem de muito dinheiro, o senso comum é de investir num item de conveniência como ar-condicionado, que terá uso diário, não em um item de segurança que, pelo menos se espera, nunca será usado. Chegamos assim a um impasse onde, como sempre, o povo é quem paga o pato.

Mas talvez não. A resposta é mesmo uma lei; afinal, elas existem para o benefício do povo (ora, pelo menos em teoria...). Apenas o "obrigar" está incorreto; incentivar é bem melhor. Basta ver o seguinte: o que ajuda a tornar os carros no Brasil tão caros? Os impostos. Bem, não pretendo sugerir aqui uma reforma tributária – seria muita audácia. Mas se houvesse para os carros equipados com airbag uma isenção, ou pelo menos um desconto nos impostos, seria crescente o número de veículos dotados desse equipamento; e, portanto, mais seguros. Quanto ao dinheiro que o governo deixaria de arrecadar, acredite: não seria metade do que é gasto nos serviços médicos e de emergência com as vitimas dos acidentes envolvendo nossos 1.0 "básicos".

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Talentos

Interessante como as pessoas nascem com talentos; características e vocações muitas vezes únicas que as marcarão por toda a vida, não raro definindo a carreira do dito cujo.

Um exemplo claro é a beleza. Talento inquestionável, é facilmente reconhecido pela sociedade. Geralmente de nascença (de preferência no sul do país) a beleza necessita apenas ser mantida ou aperfeiçoada durante a vida da pessoa. Nada além de uma vida saudável, boa alimentação e exercícios físicos (talvez um pouco de silicone...). E claro, como foi dito, esta característica marcante define a carreira do seu portador: modelo, atriz, apresentadora de TV, cantora, escritora, esposa de ricaço, ex-BBB, dentre tantas outras portas abertas para quem nasceu sob as bênçãos da deusa Vênus.

Outro talento interessante, geralmente oriundo de periferias pobres, é o de jogar futebol. Este sim pode ser bastante aprimorado, tendo início o longo preparo ainda na infância, para então ingressar nas categorias de base em pequenos clubes, seguidos por campeonatos mais expressivos e a posterior venda para um time europeu. Tamanha é a importância deste talento para a sociedade que vários destes atletas semi-analfabetos ganham salários astronômicos que a maioria de nós não irá receber em 30 anos de trabalho.

Um talento geograficamente mais difuso, porém mais comum do que se imagina, é a inteligência. Não me refiro a gostar de matemática e resolver contas com velocidade; isso é coisa pra calculadora de R$1,99. Algumas características da inteligência são a facilidade de aprendizado, rapidez de raciocínio lógico, aguçada visão espacial, habilidade manual e artesanal, sensibilidade artística, ouvido musical, dentre diversas outras. Como qualquer talento, este deve ser lapidado; existem raras escolas, muitas com critérios rigorosos de seleção, que aprimoram com muito trabalho algumas das qualidades referidas.

Para descrever melhor esse talento, prefiro deixar o texto mais pessoal, pois é sempre gostoso lembrar dos tempos de colégio. Como um bom aluno nerd, sempre participei – e com mérito – das olimpíadas. Não as de futebol ou natação, mas de matemática, física, enfim; e conheci garotos bem mais brilhantes que eu. Um deles foi várias vezes campeão em matemática, chegou a cursar um semestre no IME (para quem nunca ouviu falar, é uma universidade com vestibular bem difícil), mas decidiu que não era o que ele queria da vida. Hoje cursa psicologia e artes cênicas, inclusive se apresenta em algumas peças aqui na capital cearense. Se ele é feliz? Espero que sim. Se é rico ou famoso? Claro que não! Quem daria importância a um ator inteligente, culto, que lê livros, sabe muita matemática e nunca esteve no Big Brother ou na Malhação?

Voltando aos tempos do colégio – só explicando, um colégio particular, desses com turma especial para os alunos mais brilhantes. O que tinha de especial na turma? Nada muito interessante, apenas uma alienação pelo vestibular e um certo desprezo a coisas supérfluas, como cultura, música, vida social, cidadania... mas isso é conversa pra outro dia. Voltando ao texto, um outro sujeito prodígio que conheci por lá, desses com boas notas e resultados em olimpíadas, hoje é graduado em física. Ao terminar o curso, ele recebeu oferta de bolsa para mestrado e até doutorado no exterior. Não sei se foi por sua “inteligência”, ou só por bom senso mesmo, ele acabou fazendo vestibular para Direito. Diz que quando se formar – em Direito – vai fazer concurso público para algum emprego onde se ganha muito e trabalha pouco, o que para ele será bastante fácil.

Essas belas histórias – qualquer uma poderia aparecer num quadro no programa do Faustão – acabam me fazendo lembrar outra qualidade dos inteligentes, uma característica possivelmente nata: a frustração. Assim como uma modelo olha-se no espelho e afirma convicta: “eu sou bonita”, toda pessoa consegue, cedo ou tarde, reconhecer suas qualidades. O reconhecimento vindo dos outros é que nem sempre agrada: as tantas portas não estão abertas, nem são pagos salários astronômicos para quem teve a sina de nascer inteligente.